quarta-feira, 11 de novembro de 2009

O crime quase perfeito


O cachorro latia desesperadamente. Era difícil de concentrar-se no que quer que fosse. O vizinho nada fazia para calar o animal e isso era o que mais incomodava. Num ato impensado, pura emoção, José subiu ao muro e dali tentou ver o que acontecia. Nunca antes o cão tinha latido tanto, estava realmente descontrolado. Dali de cima conseguiu ver a cena, da qual iria se arrepender para o resto de sua vida.
A mulher estava desfigurada. O cachorro ao seu lado tentava chamar atenção para ela. A princípio o primeiro pensamento foi de que o animal a tinha atacado, deixando-a naquele estado. Mas, observando melhor, o cachorro não apresentava sinais de sangue, Apenas terra na boca o que dava a certeza dele não ter feito aquilo. Então o que teria acontecido?
Ligar para a polícia foi a atitude que tomou. Não esperava ver aquela cena, nem notou que pulara o muro, que tinha mexido no corpo e que agora estava ligando para a polícia de dentro da casa da vítima. Só foi perceber a imprudência quando a polícia tomou-o como suspeito. Teve que ir prestar depoimento. Ao se deparar com o vizinho, viu que esse tinha os olhos vidrados, injetados de sangue que se fixavam nele com tanta raiva que era temeroso ficar no mesmo local os dois juntos.
Os investigadores não encontraram nada de suspeito ou de provas, a não ser sangue nas mãos e roupas de José, além de suas digitais na porta, telefone e vestígios na mulher morta, brutalmente morta. Contratou advogado. Imagine só, era o único suspeito. O marido tinha álibi, provas de que não havia feito aquela barbaridade. A mulher não tinha inimigos, estava muito bem com a família, não tinha filhos, era somente o casal. Ela trabalhava como professora, o esposo era um artista plástico renomado naquela cidade.
José estava numa grande enrascada. A cada dia que passava sentia-se mais e mais desesperado, sem forças, encurralado. Apelou para Deus com tanta intensidade como nunca tivera feito antes, aliás, pensava e dizia ser ateu. E agora, não tinha outra saída, a não ser crer no impossível. Até os seus amigos e familiares olhavam-no sem a mesma convicção do início das investigações. Tudo parecia perdido, tudo parecia ir de mal a pior. O advogado, seu defensor, insistia com maior ênfase agora, inquirindo-o se realmente ele não tinha feito aquela barbárie. Cada vez mais, ele decepcionava-se com os seres humanos, principalmente aqueles que o conheciam há tanto tempo.
Que saudade do tempo em que seus pais eram vivos? Estava precisando de colo, de amparo, de alguém que confiasse nele. Foi a julgamento, condenado pegou vinte anos de reclusão.
Saiu três anos depois, com dezessete anos por cumprir. O cachorro tinha voltado a atacar, agora, matando o marido da vizinha, vítima pela qual José fora considerado culpado. O animal usou o mesmo método, atacou no rosto, perfurando a jugular, depois esfregou o focinho em terra até sair o sangue, pegajoso, que tanto o incomodava.

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